Todos se foram, as fotos ficaram de presente.
A bagunça também.
Fui dormir, mamãe já havia convocado sua faxineira para limpar os resquícios da noite marcante.
Não sei exatamente por que, talvez pelos estímulos da noite passada, mas hoje de manhã acordei com a imagem daquele momento que me introduziu na sensação de derrota ou, mais que isso, me trouxe à luz da consciência este meu, por anos a fio, sentimento parceiro. Estranho… a foto não era das que estavam penduradas na parede porém foi a imagem que me acordou e acompanhou em cada minuto do dia. Para mim sempre foi claro que o registro do qual fujo, simbolizava a grande dor de, pela primeira vez, não ter sido o primeiro. Eu, filho, neto e sobrinho único por quase toda a infância, deparei-me com a realidade de abrir mão dos ganhos para que terríveis rivais ficassem com o que (eu achava que) era meu. Não sabia mensurar o tamanho da dor que perder aquela prova de natação representou para mim. Lembro exatamente do dia, estava cinza como hoje e, eu, logo ao acordar, corri para a cama de meus pais, eufórico com a prova, tão esperada prova. Tudo foi mágico até o fim da competição, quando levantei a cabeça da água e percebi que tinha chegado atrás de outros três. Gosto amargo da sensação de derrota, ainda que em cima do pódio, ainda que com o troféu na mão. Anos mais tarde, na passagem da adolescência à vida adulta, este sentimento companheiro levou-me ao consultório de minha analista. Entre idas e vindas, os anos de trabalho fizeram com que eu, o grande eu, compreendesse muitas coisas relacionadas a este e outros fatos. Contudo, o eu, pequeno eu, insistia nas perguntas que já havíamos respondido de diversas formas e por inúmeras vezes. Naquela manhã, perguntei-me se não havia superado o episódio, quando na verdade, sabia que o buraco era mais fundo. Agarrava-me a ele para justificar meus medos de perda e de incapacidade. Pelos receios, tornei-me alguém solitário. Cordial, após a temporada de terapia, mas sozinho. Era chegada a hora de olhar de verdade pro que fui, pro que sou.
Serei?
—
Texto sobre uma das imagens do banco exibido no terceiro encontro.
A imagem: um menino, um pódio, um troféu, uma tristeza.
Engraçado é que o escrevi na quarta-feira e, ontem, várias coisas me levaram a ele.
Clara
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