24/02/2013

exercícios de criatividade

É.

Talvez fosse aquele o momento da solidão e inquietude combinadas e necessárias ao ato de recomeçar a criar. Sabia que estava afastada disto que era tão seu, esse movimento repleto de cargas desequilibradas, de vida, de dores, de cores, de beleza.

-  Escrever. Por que tão fácil nuns momentos e tão complexos em outros? Saria a nova idade que se aproximava? – pensava, pensava e girava. Num ágil 360º, voltava ao mesmo lugar.

Era o cansaço, talvez. O cansaço de bancar saber-se ser, quando desconhecia sua mínima composição. Ou era mesmo a falta de vocabulário.

(Tinha pensado em usar “inspiração” ao invés de “vocabulário”, mas respirava, inspirava a cada novo passo. Mais que isso, via e sentia a cada novo passo. Via os meninos no primeiro dia de aula, vestidos com uniforme da rede municipal chamando uns aos outros, mãos dadas com suas mães pelas ruas. Observava a alegria nos olhares daqueles universos que se apresentavam em pequenos e gorduchos corpos. Via os confetes nas ruas, denunciando a folia recém vivida. Enchia-se de vida.)

É, não era isso. Definitivamente, não era falta de inspiração.  Era a dificuldade de casar palavras, sem repetir-se, como sempre fazia. Organizar palavras tornava-se tarefa árdua, sobretudo quando se comparava aos outros, pior, a si mesma em outras épocas. Lembrou que quando foi buscar uma água pra tentar retomar a sobriedade, encontrou um Leminsk gritando na porta da geladeira: “abrindo um antigo caderno foi que eu descobri: antigamente eu era eterno”. E o que fazer diante de tamanhas genialidades, se não emudecer? E caímos de novo naquela velha história do pudor e compaixão, não é mesmo? Compaixão por si. Um belo aprendizado, para um pulso que ainda pulsa e uma cabeça que lateja.

Perdeu-se, escorregou pelos pensamentos, que, por sua vez, lhe escorriam por entre os dedos entreabertos sobre o negro teclado. A caixola atrofiava-se e, sem que se percebesse, voltava a escrever. Não se deu conta, impedida pelo medo petrificante de não ser aquilo que queria ou que achava que era, ao passo em que já estava sendo. E já não estava mais pedindo socorro porque aquela era sua cura. Escrever qualquer coisa que a cabeça teclante e os dedos pensantes a obrigassem a expurgar.

Foi com tudo, preencheu a página. Desnudou-se, jogou-se, mas não declarou-se. Por enquanto, livrar-se daquela necessidade era o que lhe tomava a energia. Livrar-se para ter outra vital necessidade, da qual também se livraria para dar lugar a uma nova e assim sucessivamente. E recordou outra frase, agora do filme Leopardo, que fala que é preciso mudar para que tudo fique no mesmo lugar. Pensou que acabara, mas nunca se acaba, tolinha. Sabia que não acabara, mas ombros destravaram e a boca esboçou uma abertura, insinuando certo sono. Deu um primeiro passo e foi dormir.

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